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Desclassificação em Concurso Público em razão de boletim de ocorrência é ilegal? 

Antes de tratar sobre a desclassificação em concurso público pela existência de boletim de ocorrência, vejamos Dois pontos importantes:

 1. Presunção de Inocência no Brasil

No Brasil, vigora o princípio da presunção de inocência (isso significa dizer que TODOS são considerados inocentes até que se prove o contrário) – Art. 5º, inciso LVII da Constituição Federal: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”; 

Pense na situação hipotética de que uma pessoa foi encontrada ao lado do corpo de seu melhor amigo recém-falecido, segurando uma faca ensanguentada aos prantos e repetindo incessantemente: “Desculpa, eu não queria que fosse assim”. Nesse momento, ela é culpada do crime de homicídio contra o amigo? NÃO, por mais que os indícios apontem que tenha agido de forma ilícita, ainda assim, será INOCENTE até que haja uma decisão proferida em processo judicial. 

Processo judicial, como o nome sugere, é aquele conduzido por um Juiz Competente, onde é garantida a defesa do acusado e o resultado (condenação ou absolvição) é fundamentado em Lei. 

2. Boletim de Ocorrência

O que é um boletim de ocorrência? Basicamente, o Boletim de Ocorrência é um documento utilizado pelos cidadãos para dar conhecimento à Autoridade Policial da ocorrência de um crime, chamamos isso no Direito de notícia-crime. 

Nem tudo que reluz é ouro, e nem tudo que é injusto é crime. Pode (e acontece com frequência) que cidadãos compareçam até a Delegacia para relatarem fatos que não caracterizem efetivamente crimes ou que após a sua comunicação à Autoridade Policial, precise de uma atuação ativa da vítima para a continuidade do processo, como nos crimes de injúria ou difamação, em regra. 

Vamos as explicações: 

A essa altura, talvez já esteja clara a resposta à pergunta do título. Poderia um candidato ser excluído na fase de investigação social do Concurso da Polícia Militar por constar em seu desfavor boletins de ocorrência? 

Em Sentença de Mandado de Segurança, o Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR deu provimento ao pedido de candidata que foi excluída do Concurso Público da Polícia Militar do Estado do Paraná por possuir boletim de ocorrência registrado em seu desfavor. 

A linha argumentativa defendida foi de que o simples registro de boletim de ocorrência sem maiores desdobramentos é insuficiente para inabilitar a parte para exercício da atividade policial por ser desproporcional e ferir a presunção de inocência. 

Invocou-se o precedente do Supremo Tribunal Federal ao julgar o Tema nº. 22, em regime de Repercussão Geral, estabeleceu que “(…) sem previsão constitucional adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal.” 

Na decisão, o Magistrado destacou que: “(…) Isto porque a mera lavratura de Boletim de Ocorrência não deve ser confundida com o processo criminal e não deve ser levado em conta como reincidência ou mau antecedente”. 

Logo, se foi registrado o boletim de ocorrência, em que a vítima sentiu ter seus direitos violados por um crime, mas ocorreu o seguimento ao processo (Ação Penal), volta-se a condição inicial de presunção de inocência. 

Essa argumentação serve para todos, como um coringa em casos de reprovações em investigação social? Óbvio que não, cada caso conta com suas peculiaridades, mas um olhar atento aos princípios do Direito é suficiente para ajudar na argumentação para recursos e eventuais ações judiciais. 


DHIOGO ANOÍZ (OAB/PR nº. 58.623) – Advogado e Professor de Direito Público.  


Informações constantes do processo nº. 0004130-34.2022.8.16.0004 – 2ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba. 

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